quinta-feira, 20 de outubro de 2011

As borboletas, as mariposas e o eremita.

Em tempos remotos, eremita era aquele sujeito que por aversão à natureza humana, por religiosidade ou por penitência, vivia em um lugar deserto ou isolado. Hoje em dia, lugar melhor não há para pagar penitência, isolar-se e cultivar a aversão à natureza humana que a “night”! Calma, desde já esclareço: não sou puritano. E, por certo, a “night” tem seus prazeres.

Contudo, a descrença no ser humano e a banalização dos sentimentos é que vêm fazendo com que, não raramente, borboletas se disfarcem de mariposas para sobreviver. Se ser romântico é ultrapassado, acreditar no outro é ser ingênuo e fatalmente conduz à frustação, parece não restar outra opção às borboletas, se não envolver suas qualidades coloridas em mantos pardos, aderindo aos hábitos noturnos das mariposas, conhecidas também como bruxas.

É que ser bruxa é mais fácil e seguro que ser borboleta. As bruxas não chamam a atenção, se misturam com facilidade na escuridão da noite, pousam com as assas abertas, prontas para um voo de urgência pra qualquer lugar distante. As borboletas, por outro lado, deslumbram com o colorido, despertam inveja e são presas fáceis, pois quando pousam, mantêm sempre as assas fechadas pela certeza do querer ficar.  

E é por isso que discordo de uma frase comumente dita por aí: “na balada se vê de tudo”. Ouso me opor, pois acredito que na balada o que se vê é a mesma coisa: pessoas disfarçadas, que compram o que não precisam, com o dinheiro que nem sempre têm, para parecer aquilo que não são. Acabam todos iguais. Vítimas e executores, transformando o colorido em um monótono e triste pardo.

E com o tempo o disfarce vai tomando o lugar do ser, consumindo toda a existência de borboleta com tamanha força, que se esquecem de vez as borboletas de tudo que eram e poderiam ser, negam os sentimentos, secam a esperança. Assas sempre abertas, não pelo prazer de voar, mas pela necessidade do fugir.   

Assim, a diversidade de cores que pintam a existência humana vai se perdendo. No engolir das lágrimas se engole também os sorrisos, cada vez mais dependente da aparência do que da existência. Se esquecem as borboletas de todo o seu arrastar como lagartas e de toda metamorfose do casulo que lhes proporcionaram a leveza, condicionando-se ao existir  limitado da mariposa. Se a crisálida outrora era o ovo que continha toda potencialidade do ser, negam sua natureza as borboletas que covardemente se abatem pela imposição do ter.

Mas a pior parte é que deixar de disfarçar-se de mariposa não te conduz automaticamente ao estado anterior de borboleta. Algumas vezes você se transforma em um eremita, que se conforta aos poucos com a necessidade de voltar a ser lagarta, passar pela metamorfose do casulo, para só então retomar sua natureza de borboleta. 


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